Os despachos do PGR no caso das escutas ao Primeiro-Ministro
Com data de 23.12.09, o PGR emitiu o seguinte comunicado:
“NOTA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL
“Os contínuos pedidos, a vários níveis, de divulgação das escutas surgidas no decurso da investigação levada a cabo pelo Departamento de Investigação e Acção Penal de Aveiro no chamado caso “Face Oculta”, justificam o seguinte esclarecimento:
“- 1º -
“Recebidas que foram na Procuradoria-Geral da República certidões extraídas daquele inquérito, o Procurador-Geral da República proferiu em 23.07.2009 um despacho onde se escreveu como conclusão:
“a) Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 187º, n.ºs 1, 7 e 8, 188º, 11º, n.º 2, alínea b), e 190º do Código de Processo Penal, são nulos os actos relativos à intercepção, gravação e transcrição das conversações e comunicações em que intervém o Primeiro-Ministro.
“b) Não existem, mesmo abstraindo desta nulidade, indícios probatórios que determinem a instauração de procedimento criminal contra o Primeiro-Ministro, designadamente pela prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, previsto e punido pelo artigo 9º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.
“E, em 18.11.2009, outro despacho no qual se concluiu da seguinte forma:
“a) Não existem, no conjunto dos documentos examinados, elementos de facto que justifiquem a instauração de procedimento criminal contra o Primeiro-Ministro José Sócrates e/ou qualquer outro dos indivíduos mencionados nas certidões, pela prática do referido crime de atentado contra o Estado de Direito;
“- 3º -
“Transitadas em julgado essas decisões, proferidas de acordo com a posição do Procurador-Geral da República, impõe-se o seu acatamento, razão pela qual não é possível facultar o acesso a tais certidões;
“- 4º -
“Igualmente não é possível facultar certidões dos despachos proferidos pelo Procurador-Geral da República, uma vez que nos mesmos se encontram transcritas partes dos relatórios referentes às gravações em causa, já que não seria possível fundamentar os despachos sem referir o que foi escutado (no todo ou em parte);
“- 5º -
“A divulgação dos despachos violaria assim igualmente as decisões do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
“- 6º -
“A investigação no processo “Face Oculta” (que nada tem a ver com o que se discute nas escutas) prosseguirá com toda a determinação, a fim de se apurarem os ilícitos existentes, por forma a poderem ser sancionados os eventuais responsáveis;
“- 7º -
“- 8º -
“São, por isso, destituídos de qualquer fundamento jurídico todos os comentários que ponham em causa a isenção dos investigadores e o seu rigoroso respeito pelas normas vigentes.
“As decisões integrais do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça poderão ser consultadas por todos aqueles que provarem ter interesse legítimo para tal, de harmonia com as leis em vigor.
“Lisboa, 23 de Dezembro de 2009
“O Procurador-Geral da República
(Fernando José Matos Pinto Monteiro)”
Impõe-se, pela sua relevância, quanto mais não seja social, uma breve análise sobre este comunicado.
Começa-se nele por dizer que o PGR recebeu certidões do processo “Face Oculta”, a correr termos em Aveiro.
Depois, diz-se que as escutas recebidas pelo PGR são nulas, porque nelas interveio o Primeiro Ministro, sem autorização do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (pSTJ).
Logo a seguir diz-se que “não existem, mesmo abstraindo desta nulidade, indícios probatórios que determinem a instauração de procedimento criminal contra o Primeiro-Ministro, designadamente pela prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, previsto e punido pelo artigo 9º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.”
Com efeito, em que suporte processual (inquérito ou expediente administrativo) apreciou o PGR tais “indícios probatórios contra o Primeiro-Ministro, designadamente pela prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, previsto e punido pelo artigo 9º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.” ?
E tal inquérito nunca poderia ser autuado na PGR, mas antes obrigatoriamente nas secções criminais do STJ, por força do art.º 11, n.ºs 3, alínea a) e 7 do Código de Processo Penal.
Cometeu aqui o PGR o crime de prevaricação previsto e punido no artº 369º, nº 1 do Código Penal?
A tipicidade do crime do art.º 369.º citado começa por exigir a actuação tenha sido no âmbito de um inquérito processual ou processo jurisdicional, mas depois afirma que o agente cai no tipo se praticar acto [contra direito] no exercício de poderes decorrentes do cargo que exerce.
Indicia-se, assim, fortemente, a prática deste crime pelo PGR.
Que se impõe seja investigado, nos termos da lei, já que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da legalidade estrita, ou seja, nenhuma “política criminal” pode impedir a investigação de um crime com as legais consequências.
Voltando ao comunicado:
Afirma-se, no ponto 2.º que “O Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, no uso de competência própria e exclusiva, proferiu decisões onde, além do mais, julgou nulos os despachos do Senhor Juiz de Instrução que validaram as extracções de cópias das gravações, não validou as gravações e transcrições e ordenou a destruição de todos os suportes a elas referentes”.
Aceitar-se-á que o pSTJ tenha dado tais despachos no âmbito de um incidente do inquérito de Aveiro, corporizado por tais certidões, actuando como Juiz de Instrução Criminal, único e exclusivo com competência para a questão que se levantava.
Mas, para aceitar isso, necessário se torna conhecer o teor dos despachos do PGR ao enviar as certidões para o pSTJ.
Mas o PGR recusa-se a dar conhecimento dos seus despachos, argumentando que “não é possível facultar certidões dos despachos proferidos pelo Procurador-Geral da República, uma vez que nos mesmos se encontram transcritas partes dos relatórios referentes às gravações em causa, já que não seria possível fundamentar os despachos sem referir o que foi escutado (no todo ou em parte)”.
Trata-se, sem dúvida, de uma fundamentação muito coxa e que não colhe, já que podem ser divulgados tais despachos, truncando as partes relativas à transcrição ou referência à substância das escutas consideradas ilegais e nulas pelo pSTJ.
Para além do indiciado crime de prevaricação praticado pelo PGR, como concordará qualquer jurista minimamente competente e sério, indicia-se também, em consequência, que o PGR teve (e tem tido) esta actuação nestes moldes porque está a fazer “política criminal”, fora do quadro legal e contra direito, no exercício das suas funções, indiciando-se, agora, um crime permanente de prevaricação.
O que é grave, muito grave!
Já agora, pensem nisto!
“NOTA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL
“Os contínuos pedidos, a vários níveis, de divulgação das escutas surgidas no decurso da investigação levada a cabo pelo Departamento de Investigação e Acção Penal de Aveiro no chamado caso “Face Oculta”, justificam o seguinte esclarecimento:
“- 1º -
“Recebidas que foram na Procuradoria-Geral da República certidões extraídas daquele inquérito, o Procurador-Geral da República proferiu em 23.07.2009 um despacho onde se escreveu como conclusão:
“a) Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 187º, n.ºs 1, 7 e 8, 188º, 11º, n.º 2, alínea b), e 190º do Código de Processo Penal, são nulos os actos relativos à intercepção, gravação e transcrição das conversações e comunicações em que intervém o Primeiro-Ministro.
“b) Não existem, mesmo abstraindo desta nulidade, indícios probatórios que determinem a instauração de procedimento criminal contra o Primeiro-Ministro, designadamente pela prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, previsto e punido pelo artigo 9º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.
“E, em 18.11.2009, outro despacho no qual se concluiu da seguinte forma:
“a) Não existem, no conjunto dos documentos examinados, elementos de facto que justifiquem a instauração de procedimento criminal contra o Primeiro-Ministro José Sócrates e/ou qualquer outro dos indivíduos mencionados nas certidões, pela prática do referido crime de atentado contra o Estado de Direito;
“b) Entregues que se encontram as certidões e CDs ao Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, aguardar-se-á que se pronuncie sobre os actos relativos à intercepção, gravação e transcrição das conversações e comunicações em que intervém o Primeiro-Ministro;
- 2º -
“O Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, no uso de competência própria e exclusiva, proferiu decisões onde, além do mais, julgou nulos os despachos do Senhor Juiz de Instrução que validaram as extracções de cópias das gravações, não validou as gravações e transcrições e ordenou a destruição de todos os suportes a elas referentes;
“- 3º -
“Transitadas em julgado essas decisões, proferidas de acordo com a posição do Procurador-Geral da República, impõe-se o seu acatamento, razão pela qual não é possível facultar o acesso a tais certidões;
“- 4º -
“Igualmente não é possível facultar certidões dos despachos proferidos pelo Procurador-Geral da República, uma vez que nos mesmos se encontram transcritas partes dos relatórios referentes às gravações em causa, já que não seria possível fundamentar os despachos sem referir o que foi escutado (no todo ou em parte);
“- 5º -
“A divulgação dos despachos violaria assim igualmente as decisões do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
“- 6º -
“A investigação no processo “Face Oculta” (que nada tem a ver com o que se discute nas escutas) prosseguirá com toda a determinação, a fim de se apurarem os ilícitos existentes, por forma a poderem ser sancionados os eventuais responsáveis;
“Saliente-se que a investigação tem decorrido com observância de todos os princípios vigentes num Estado de Direito, sendo de elogiar a eficiência e discrição dos Magistrados do Ministério Público, designadamente do Departamento de Investigação e Acção Penal de Aveiro e dos Órgãos de Polícia Criminal que com ele colaboram;
“- 8º -
“São, por isso, destituídos de qualquer fundamento jurídico todos os comentários que ponham em causa a isenção dos investigadores e o seu rigoroso respeito pelas normas vigentes.
“As decisões integrais do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça poderão ser consultadas por todos aqueles que provarem ter interesse legítimo para tal, de harmonia com as leis em vigor.
“Lisboa, 23 de Dezembro de 2009
“O Procurador-Geral da República
(Fernando José Matos Pinto Monteiro)”
Impõe-se, pela sua relevância, quanto mais não seja social, uma breve análise sobre este comunicado.
Começa-se nele por dizer que o PGR recebeu certidões do processo “Face Oculta”, a correr termos em Aveiro.
Depois, diz-se que as escutas recebidas pelo PGR são nulas, porque nelas interveio o Primeiro Ministro, sem autorização do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (pSTJ).
Logo a seguir diz-se que “não existem, mesmo abstraindo desta nulidade, indícios probatórios que determinem a instauração de procedimento criminal contra o Primeiro-Ministro, designadamente pela prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, previsto e punido pelo artigo 9º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.”
Aqui, juridicamente, a “porca começa a torcer o rabo”.
Com efeito, em que suporte processual (inquérito ou expediente administrativo) apreciou o PGR tais “indícios probatórios contra o Primeiro-Ministro, designadamente pela prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, previsto e punido pelo artigo 9º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.” ?
Se o PGR apreciou “indícios probatórios” (sic) contra o Primeiro-Ministro, designadamente pelo crime de atentado contra o Estado de Direito, é porque alguém noticiou tal crime. Assim sendo, o PGR teria, se cumprisse a Lei, que obrigatoriamente abrir inquérito para apreciação da questão, como aquela impõe.
Com efeito, dispõe o artigo 262.º do Código de Processo Penal:
“Artigo 262.º
Finalidade e âmbito do inquérito
“1 — O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação.
2 — Ressalvadas as excepções previstas neste Código, a notícia de um crime dá sempre lugar à abertura de inquérito.”
Ora, o PGR apreciou a notícia do eventual crime de atentado ao Estado de Direito, sem abrir inquérito, violando flagrantemente o n.º 2 deste preceito processual penal.
Com efeito, dispõe o artigo 262.º do Código de Processo Penal:
“Artigo 262.º
Finalidade e âmbito do inquérito
“1 — O inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação.
2 — Ressalvadas as excepções previstas neste Código, a notícia de um crime dá sempre lugar à abertura de inquérito.”
Ora, o PGR apreciou a notícia do eventual crime de atentado ao Estado de Direito, sem abrir inquérito, violando flagrantemente o n.º 2 deste preceito processual penal.
E tal inquérito nunca poderia ser autuado na PGR, mas antes obrigatoriamente nas secções criminais do STJ, por força do art.º 11, n.ºs 3, alínea a) e 7 do Código de Processo Penal.
Cometeu aqui o PGR o crime de prevaricação previsto e punido no artº 369º, nº 1 do Código Penal?
A tipicidade do crime do art.º 369.º citado começa por exigir a actuação tenha sido no âmbito de um inquérito processual ou processo jurisdicional, mas depois afirma que o agente cai no tipo se praticar acto [contra direito] no exercício de poderes decorrentes do cargo que exerce.
Indicia-se, assim, fortemente, a prática deste crime pelo PGR.
Que se impõe seja investigado, nos termos da lei, já que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da legalidade estrita, ou seja, nenhuma “política criminal” pode impedir a investigação de um crime com as legais consequências.
Voltando ao comunicado:
Afirma-se, no ponto 2.º que “O Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, no uso de competência própria e exclusiva, proferiu decisões onde, além do mais, julgou nulos os despachos do Senhor Juiz de Instrução que validaram as extracções de cópias das gravações, não validou as gravações e transcrições e ordenou a destruição de todos os suportes a elas referentes”.
Aceitar-se-á que o pSTJ tenha dado tais despachos no âmbito de um incidente do inquérito de Aveiro, corporizado por tais certidões, actuando como Juiz de Instrução Criminal, único e exclusivo com competência para a questão que se levantava.
Mas, para aceitar isso, necessário se torna conhecer o teor dos despachos do PGR ao enviar as certidões para o pSTJ.
Mas o PGR recusa-se a dar conhecimento dos seus despachos, argumentando que “não é possível facultar certidões dos despachos proferidos pelo Procurador-Geral da República, uma vez que nos mesmos se encontram transcritas partes dos relatórios referentes às gravações em causa, já que não seria possível fundamentar os despachos sem referir o que foi escutado (no todo ou em parte)”.
Trata-se, sem dúvida, de uma fundamentação muito coxa e que não colhe, já que podem ser divulgados tais despachos, truncando as partes relativas à transcrição ou referência à substância das escutas consideradas ilegais e nulas pelo pSTJ.
Para além do indiciado crime de prevaricação praticado pelo PGR, como concordará qualquer jurista minimamente competente e sério, indicia-se também, em consequência, que o PGR teve (e tem tido) esta actuação nestes moldes porque está a fazer “política criminal”, fora do quadro legal e contra direito, no exercício das suas funções, indiciando-se, agora, um crime permanente de prevaricação.
O que é grave, muito grave!
Já agora, pensem nisto!
1 Comments:
SE SOUBESSEM O QUE ME ACONTECEU...e avaliar por isto que leio...eu chego a uma conclusão...eu não nasci no país errado....EU NASCI NO MUNDO ERRADO!!! Como é possível tanta falta de integridade...???!!!As pessoas quando assim actuam, é algo que trazem de berço...porque muito má é a escola do CEJ...mas ela não ensina, nem nenhuma Universidade ensina a ser tão repugnante...
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