quinta-feira, agosto 30, 2007

QUANDO NÓS, MAGISTRADOS, SOMOS USADOS

Conta-se a história de um magistrado, pessoa de bem, competentíssimo na sua função, mas ingénuo o suficiente para cair numa armadilha política.

O magistrado, em férias, conheceu um empresário que dizia dedicar-se a uma causa política muito justa, com enorme repercussão internacional, na comunicação social e em livros publicados, que se traduzia na “causa” de um povo asiático, designadamente uma minoria étnica, com tradições cristãs, que lutava pela sua libertação do jugo de uma junta militar que se havia apoderado do poder através de um golpe militar que não respeitara as eleições democráticas que dera o poder a um partido democrático.

Forneceu o empresário ao magistrado diversa documentação (livros, revistas, dossiers, folhetos de conferências internacionais apoiadas por dirigentes políticos do ocidente e até cassetes-vídeo com intervenções dos opositores à ilegítima junta militar que se apoderara do poder).

O magistrado simpatizou com a causa e falava dela aos seus amigos e colegas, longe da realidade dos meandros da porca da política.

Certo dia, o empresário telefona ao magistrado dizendo-lhe que haveria uma recepção a um líder da oposição democrática, daquele país asiático – que ele, empresário, bem conhecia pois ele próprio pertencia a um comité internacional ligado àquela causa democrática - pela mais importante autarquia do nosso país e a que estariam presentes, para além do presidente da autarquia, diversas outras personalidades nacionais e até um prémio Nobel da paz de língua oficial portuguesa, incluindo-se, entre os convidados, mesmo agentes da PJ, um dos quais o magistrado conhecia.

O magistrado aceitou o convite – dada a sua simpatia por aquela causa de um povo que se pretendia libertar do jugo de uma ditadura militar e que pretendia a sua democracia – e compareceu àquele jantar na autarquia.

Houve discursos do líder da oposição daquele país asiático, do prémio Nobel e do presidente da autarquia.

A causa era sem dúvida justa e todos aplaudiram e deram a sua solidariedade.

Saídos da recepção, o grupo do país asiático juntou-se ao empresário que convidou o magistrado a tirar uma fotografia com o dirigente asiático.

O magistrado aceitou – dadas as figuras públicas apoiantes daquela causa -, não sem que um pouco antes do “disparo” da máquina fotográfica, um dos elementos do grupo asiático chamasse a atenção do magistrado de que, “na Ásia, quando se apoia um líder político, tira-se uma fotografia com o braço no ombro do líder”.

Antes que o magistrado tivesse tempo para reflectir, pôs a mão no ombro do líder e lá surgiu a fotografia que, para o mundo, indicava que o líder asiático até tinha o apoio e certa intimidade de “magistrados” portugueses.

E, em política, o que parece, é.

O fim da história é que, a final, o dito empresário fazia tráfico de armas para aquele país asiático e que o líder da oposição do mesmo país se dedicava ao tráfico internacional de droga.

Claro que o magistrado nunca mais teve qualquer tipo de contacto com tal líder asiático nem nunca mais ouviu falar dele em luta por tal causa.
Quanto ao empresário, nunca mais falou na causa daquele povo.

Cuidado, pois, magistrados, com as “causas” políticas.

É assim que, nós, magistrados, somos usados.
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