quarta-feira, dezembro 05, 2018

A NEGATIVIDADE…

«No que diz respeito à tendência para a negatividade, a nossa cultura intelectual não está equipada para lidar com ela. De facto, a nossa vigília para os perigos ao nosso redor abre um mercado para indivíduos mesquinhos que nos alertam para as ameaças que nos possam ter escapado. Experiências têm mostrado que um crítico que arrase um livro é tido como mais competente do que um crítico que lhe faça um elogio, o mesmo podendo ser verdade em relação à crítica social. «Assume sempre o pior e serás aclamado profeta», avisou-nos uma vez o músico e humorista Tom Lehrer. Desde o tempo dos profetas hebreus, pelo menos, que misturavam a sua crítica social com prenúncios de desgraça, o pessimismo tem sido associado à seriedade moral. Os jornalistas acreditam que ao acentuar o negativo eles estão a cumprir o seu dever como cães de guarda, “muckrakers”, delatores e aterrorizadores do confortável. E os intelectuais sabem que obtêm uma seriedade imediata ao apontarem para um problema por solucionar e teorizá-lo como um sintoma de uma sociedade doente.
«O contrário é igualmente verdadeiro. O economista e ensaísta Morgan Housel tem observado que, enquanto os pessimistas parecem estar a tentar ajudar, os otimistas soam como se estivessem a tentar vender algo. Sempre que alguém sugere uma solução para um problema, os críticos rapidamente relembram que não é uma panaceia, uma bala de prata, uma bala mágica ou uma solução para todos os gostos; é apenas um curativo ou um remendo tecnológico improvisado, incapaz de chegar às causas profundas e que irá contra-atacar com efeitos secundários e consequências indesejadas. Obviamente, já que nada é uma panaceia e que tudo tem efeitos secundários (é impossível que da nossa ação surta um só efeito), estes lugares-comuns não são mais do que a recusa em considerar possível que qualquer coisa melhore.
«O pessimismo entre os intelectuais pode também ser uma forma de tentarem demonstrar superioridade. Uma sociedade moderna é uma liga de elites políticas, industriais, financeiras, tecnológicas, militares e intelectuais, todas em competição por prestígio e influência, e partilhando diferentes responsabilidades no funcionamento da sociedade. As queixas sobre a sociedade moderna podem ser uma forma dissimulada de denegrir um rival – para os académicos se sentirem superiores aos empresários, para os empresários se sentirem superiores aos políticos, e assim sucessivamente. Assim como Thomas Hobbes observou, em 1651, «a competição por louvores tende para uma reverência para a antiguidade. Pois os homens disputam com os vivos, não com os mortos».»
(In “O ILUMINISMO AGORA”, de Steven Pinker, Editorial Presença, págs. 69 e 70)

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