quarta-feira, maio 10, 2006

"COPOS" E LIBERDADE

«Às vezes, é preciso atingir o estado de embriaguez, não para que nos afundemos, mas sim para que nos acalmemos: de facto, a bebida dissipa todas as preocupações, eleva o ânimo e cura não só algumas doenças, como também a tristeza. O inventor do vinho foi chamado Liber não por causa da sua língua licenciosa, mas sim porque o vinho liberta a alma das preocupações que a condicionam, fortalecendo-a, revigorando-a e tornando-a mais audaz em todas as suas empresas. Mas, tal como a liberdade, o vinho só é benéfico quando tomado com moderação. (...). Mas não convém recorrermos sempre à bebida, para que a alma não faça dela um mau hábito; porém, devemos, por vezes, dar largas à nossa alegria e à nossa exuberância, dispensando, por vezes, a sobriedade. De facto, se acreditarmos no poeta grego: "Enlouquecer é, por vezes, alegre"; em Platão: "um homem de bom senso bate à porta da poesia em vão"; ou em Aristóteles: "nunca houve nenhum génio sem uma ponta de loucura". Só uma mente perturbada pode dizer algo grandioso e acima do que os outros homens normalmente proferem. Quando despreza os pensamentos vulgares e os lugares comuns e é erguido às alturas pela inspiração sagrada, o homem entoa palavras grandiosas com a sua boca mortal. Enquanto uma pessoa está em si, não pode alcançar o sublime ou o inatingível: deverá, por isso, desviar-se do caminho normal, revoltar-se, morder o freio, arrancar as rédeas ao cavaleiro, levando-o a alturas que ele temeria atingir.»
(Séneca, séc. I d.C., "Da Tranquilidade da Alma", XVI-8-11)
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