sexta-feira, março 15, 2019

O BUDA E O SENTIDO DA VIDA…

«O Buda ensinou que as três realidades básicas do universo são que tudo está em constante mudança, que nada tem uma essência duradoura e que nada satisfaz totalmente. Podemos explorar os confins mais longínquos da galáxia, o nosso corpo ou a nossa mente, mas nunca encontraremos algo que não mude, que tenha uma essência eterna e que nos satisfaça por completo.
«O sofrimento emerge porque as pessoas não veem isto. Acreditam que existe algures uma essência eterna e que, se conseguirem descobri-la, ficarão plenamente satisfeitas. A esta essência eterna, por vezes, chama-se Deus, outras vezes chama-se nação, ou alma, ou eu autêntico, ou amor verdadeiro – e quanto mais as pessoas se apegarem a isso, mais desiludidas e infelizes ficarão ao não conseguirem encontrá-lo. Pior ainda, quanto maior o apego, maior o ódio a pessoa desenvolve a qualquer pessoa, grupo ou instituição que pareça um obstáculo entre ela e o cobiçado objetivo.
«Segundo Buda, então, a vida não tem sentido e as pessoas não precisam de criar qualquer sentido. Basta compreender que não há sentido e, assim, libertarem-se do sofrimento causado pelos nossos apegos e pela nossa identificação com fenómenos vazios. «Que devo fazer?», perguntam as pessoas, e Buda aconselha: «Não faças nada. Absolutamente nada.» O problema é, precisamente, fazermos constantemente qualquer coisa. Não necessariamente ao nível físico – podemos ficar sentados durante horas, sem nos mexermos e de olhos fechados -, mas ao nível mental estamos extremamente ocupados a criar histórias e identidades, a travar batalhas e a conquistar vitórias. Fazer realmente nada significa também a mente nada fazer e nada criar.
«Infelizmente, também é muito fácil transformar isto num épico heróico. Mesmo quando nos sentamos de olhos fechados e observamos o ar a entrar e a sair das nossas narinas, podemos começar a construir histórias sobre isso. «A minha respiração está um pouco forçada, e se eu respirar com mais calma serei mais saudável», ou «Se continuar a prestar atenção à minha respiração e nada fizer, tornar-me-ei iluminado e serei a pessoa mais sábia e feliz do mundo». Depois, o épico começa a alastrar e as pessoas embarcam numa demanda, não só para se libertarem a si mesmas dos seus próprios apegos, mas também para convencer outros a fazê-lo. Tendo aceitado que a vida não tem sentido, descubro sentido na explicação meditador aos outros, argumentando com quem não crê, dando palestras aos céticos, doando dinheiro para a construção de mosteiros, e assim por diante. «História nenhuma» pode tornar-se muito facilmente outra história.
«A história do budismo dá-nos mil exemplos de pessoas que acreditam na transitoriedade e no vazio de todos os fenómenos e na importância de não ter quaisquer apegos, mas que conseguem guerrear entre si pelo governo de um país, a posse de um edifício ou mesmo o significado de uma palavra. Lutar com outras pessoas porque se crê na glória de um Deus eterno é lamentável mas compreensível: lutar com outras pessoas porque se acredita no vazio de todos os fenómenos é verdadeiramente bizarro – mas muito humano.»
(In “21 Lições para o Século XXI”, de Yuval Noah Harari, ELSINORE, págs. 347 e 348)
- Victor Rosa de Freitas –

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