segunda-feira, dezembro 15, 2014

A CONQUISTA DA «LIBERDADE ACADÉMICA»... NA IDADE MÉDIA...


«Em Março de 1229, no início do Carnaval pré-Quaresma - que era muito semelhante a um carnaval dos tempos modernos, com máscaras, comportamentos desinibidos e tudo - um grupo de estudantes da Universidade de Paris viu-se envolvido num conflito com um taberneiro por causa da conta. Começaram à pancada, os outros clientes apoiaram o taberneiro e os estudantes foram espancados e atirados para a rua. Voltaram no dia seguinte com reforços e varapaus, entraram na taberna, espancaram o taberneiro e os clientes, partiram tudo e continuaram depois os distúrbios na rua.
«As autoridades municipais exigiram um castigo. As autoridades universitárias escudaram-se na dispensa, concedida pela Igreja, de comparecer perante os tribunais, uma vez que a universidade era uma instituição religiosa. Mas Branca de Castela, mãe de Luís XIV, que era, à altura, regente do trono de França, exigiu um castigo. A universidade permitiu então que as autoridades municipais levantassem um processo contra os estudantes. Infelizmente, os guardas municipais prenderam um grupo de estudantes que não tinham participado nos distúrbios e chegaram mesmo a matar alguns deles.
«A universidade entrou em greve. Os docentes recusaram-se a trabalhar e as aulas foram todas canceladas. Muitos estudantes voltaram para casa; alguns foram para outras universidades, incluindo Oxford e Cambridge. A greve provocou uma crise económica grave em Paris.
«Dois anos depois, o Papa Gregório IX, ele próprio licenciado pela universidade, publicou uma bula que garantia à instituição uma liberdade total das autoridades locais - incluindo os dirigentes eclesiásticos -, colocando-a sob a alçada directa do papado. A universidade ficava, assim, com o direito de estabelecer as suas próprias regras e estatutos, assim como o direito exclusivo de castigar as violações a essas regras e estatutos. Mesmo os processos criminais levantados contra docentes e estudantes só podiam ser julgados num tribunal eclesiástico, nunca num tribunal civil. A bula papal passou a ser a carta estatutária da universidade, que, por sua vez, serviu de modelo para outras novas universidades.
«Além de garantir a isenção eclesiástica das autoridades civis, a carta estatutária punha todo o poder nas mãos do corpo docente. Era este quem decidia quem era admitido nas suas fileiras e que o não era. Resumindo em poucas palavras, a universidade gozava de uma «liberdade académica» praticamente ilimitada.»
(In "O TRIUNFO DO OCIDENTE", de Rodney Stark, Guerra e Paz Editores, págs. 177 e 178)
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