sábado, setembro 28, 2019

NÃO NOS SUBESTIMEM…

«Não me lembro muito bem do liceu porque passei uma boa parte dele a dormir, para compensar as minhas noites insones diante do computador. Na Arundel High, a maior parte dos professores não se opunha ao meu habitozinho de fazer uma soneca e deixava-me em paz desde que não ressonasse, mas mesmo assim havia uns quantos, sorumbáticos e cruéis, que julgavam ser seu dever acordar-me – com guinchos de giz ou bater de apagadores e emboscar-me com uma pergunta:
« - Que lhe parece, senhor Snowden?
«Eu levantava a cabeça da mesa, sentava-me direito na cadeira, bocejava e, enquanto os meus colegas tentavam abafar o riso – tinha de responder.
«A verdade é que adorava aqueles momentos, que se contavam entre os maiores desafios que o liceu tinha para me oferecer. Adorava ser posto na berlinda, zonzo de sono, com trinta pares de lhos e ouvidos postos em mim à espera de assistir ao meu falhanço, enquanto eu procurava uma pista no quadro meio vazio. Se conseguisse pensar suficientemente depressa para me sair com uma boa resposta, era uma lenda. Mas se fosse demasiado lento, podia sempre recorrer a uma piada – nunca é demasiado tarde para uma piada. No pior dos casos, tartamudeava qualquer coisa, e os meus colegas pensavam que eu era estúpido. Deixá-los pensar. Devemos sempre deixar que as pessoas subestimem. Porque, quando as pessoas subestimam a nossa inteligência e capacidades, estão só a destacar as suas vulnerabilidades – os enormes buracos na sua capacidade de julgamento que têm de permanecer abertos para que depois possamos passar através deles num cavalo flamejante, repondo a verdade com a espada da justiça.»
(In “Vigilância Massiva Registo Permanente”, de Edward Snowden, Grupo Planeta, págs. 81 e 82)
- Victor Rosa de Freitas –

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