segunda-feira, julho 02, 2018

DONS E TALENTOS…


«Os seres humanos nascem com determinadas capacidades ou potencialidades latentes, que também podemos chamar de dons. Um dom, quando desenvolvido, torna-se um talento, ou seja, algo que a pessoa faz muito bem e com facilidade. Normalmente, o talento da pessoa é algo que ela gosta muito de fazer, é uma paixão.
«Vejo muitos jovens sofrerem com a dificuldade de escolher a profissão que irão exercer na vida. Essa dificuldade existe porque não conseguem reconhecer os seus próprios dons, não sabem o que realmente gostam de fazer. Esse é outro sintoma decorrente dos condicionamentos mentais gerados por um sistema obcecado pelo dinheiro. Vivemos numa sociedade ambiciosa que valoriza mais o poder financeiro do que a realização pessoal. O nosso sistema educativo não proporciona à criança o contacto com aquilo de que verdadeiramente gosta. Pelo contrário: somos obrigados a estudar temas e a aprender coisas nas quais não temos interesse ou para as quais não temos aptidão e que, na maioria das vezes, não terão utilidade na nossa vida. Também somos levados a acreditar que determinadas atividades são superiores a outras porque elevam o estatuto social e, teoricamente, garantem estabilidade financeira. A profissão muitas vezes é escolhida de acordo com as tendências do mercado, e as paixões acabam por ser vividas esporadicamente como “hobbies” de fim de semana.
«Os meios de comunicação e as redes sociais também exercem uma grande influência nas nossas escolhas. Neles, personalidades, atitudes e estilos de vida são alvo de culto, personagens inspiram comportamentos e pessoas tornam-se ídolos. A publicidade gera desejos e fomenta o consumismo. Por outras palavras, os “media” instigam o desejo de poder e a ganância. Eles alimentam o falso eu e tudo aquilo que dá poder ao ego. E o ego é muito ambicioso. Sonha sempre com coisas muito grandiosas e fantasia que veio para fazer algo muito importante e especial, ou que acabará por se tornar rico e famoso. Muitas vezes isso acontece, mas, na maior parte dos casos, não passa de uma fantasia que impede a pessoa de ter acesso àquilo que realmente veio fazer. A partir de uma imagem mental, o indivíduo idealiza um estilo de vida e acaba por perder muito tempo a tentar realizar algo que não tem nada que ver com aquilo que realmente veio realizar.
«Por exemplo, vamos supor que o ego quer ser um grande líder espiritual ou um artista famoso, mas que a alma veio com o programa de viver numa comunidade espiritual para servir os outros. A alma veio para varrer o salão, lavar os vidros, cozinhar para muitas pessoas, regar flores, cantar mantras, rezar e meditar. Imagine a contradição. Uma pessoa muito ambiciosa, que sonha com fama e poder, mas cuja realidade desenha caminhos completamente opostos a esse, torna-se no mínimo ansiosa e angustiada. É comum que esse indivíduo carregue angústia e, dependendo da dimensão do conflito interno, é natural que sofra de depressão ou até mesmo de outras doenças físicas e psíquicas. Isto acontece porque por dentro a pessoa está a ser dilacerada: uma força puxa-a para um lado, e outra força puxa-a para outro. O ego alimenta grandes expectativas, mas a alma não tem tantas ambições.
«Portanto, não somos incentivados a reconhecer, dar valor e desenvolver os nossos verdadeiros dons, aqueles que são natos. E isso impossibilita a realização do programa da nossa alma. Para se desenvolver, um dom precisa de ser cultivado. Podemos dizer que plantamos dons para colher talentos. Para crescer e dar flores e frutos, uma planta necessita de água e de luz, além de um solo fértil. Da mesma maneira, os nossos dons precisam de ser alimentados. E isso é feito através da dedicação. Alguns dons são tão naturais que não exigem esforço para se desenvolver. Outros precisam de uma certa dedicação e de força de vontade. Alguns dons manifestam-se cedo na vida. Outros irão manifestar-se somente com a maturidade. Isto acontece porque determinados dons servirão apenas para a realização do programa externo e por isso serão desenvolvidos durante o período de afirmação do ego, que é quando o indivíduo de dedica exclusivamente ao desenvolvimento pessoal e ao sucesso material. Então, com o passar do tempo, quando o ego já foi suficientemente cristalizado e a pessoa começa a ser informada de que deve haver uma razão maior para estar encarnada aqui, novas capacidades começam a ser reveladas e desenvolvidas.
«Alguns não passarão por esse processo, porque de alguma maneira o programa do ego já se relaciona com o programa da alma. Estes continuarão a manifestar os mesmos talentos ao longo de toda a vida. O que muda é que, a determinado momento, o fazer ganha uma nova qualidade – a ação ganha alma. A ação, que antes era realizada de forma automática e superficial, apenas para corresponder às expectativas externas, passa a ter um novo significado. Apesar do talento e da paixão envolvidos na ação, ela ainda estava ao serviço do ego e da carência. Chega então o momento em que a ação ganha um novo significado e passa a servir um propósito maior. Por outras palavras, o “karma” alinha-se com o “dharma” e dá-se um encaixe.»
(In “PROPÓSITO”, de Sri Prem Baba, Pergaminho, págs. 80 a 82)

on-line
Support independent publishing: buy this book on Lulu.