domingo, maio 26, 2013

Direitos Humanos - o "Ocidente" e a China (nova edição do original de 2005)

[Na China] “o conceito de Direitos Humanos – tema recorrente e de constante polémica com os governos ocidentais – não coincide com a interpretação universalmente aceite. Direitos Humanos, em chinês, diz-se Ren Quan, que significa, literalmente, Poderes do Homem.

“- Sempre que um chinês lê ou ouve o termo 
quan, ele lê e ouve o termo poder – diz a escritora Adeline Yeh Mah.

“Pela História, e por experiência própria, ele sabia que os Direitos dependem do Poder e não são independentes dele.”


(In, Pela China Dentro, de António Caeiro, Edições D. Quixote, 4ª Edição, págs. 36 e 37).


Quando andei na Faculdade de Direito de Lisboa, a definição de direito subjectivo, pelo professor que tinha a teoria geral do direito, era de “poder de realização de um interesse juridicamente protegido”.


Sempre interiorizei que o direito de cada um era algo que a sociedade organizada reconhecia a quem o tinha desde que este o invocasse, designadamente nos Tribunais; que quem tinha um direito tinha inerentemente o respectivo poder reconhecido

Puro engano.

direito reconhecido na sociedade, pela Lei, apenas é uma hipótese de realização por quem, de facto e dentro do shi de cada um, como definido na “Arte da Guerra” de Sun Tzu, tem o PODER de o ver concretizado.

Se eu tenho o direito ao trabalho, reconhecido constitucionalmente, não significa que a Sociedade me dá trabalho. Eu tenho que ter o PODER de o conquistar.

É isto que os chineses sabem há muito e não se deixam cair em romantismos de bondade da sociedade.

bondade de que podemos beneficiar nos nossos direitos, só existe no nosso próprio relacionamento intersubjectivo que consiste no nosso PODER.

A Sociedade (política) "dá-nos" muitos direitos, mas não os reconhece a todos, a não ser que os conquistemos, conforme o "poder" relativo de cada um.

Mesmo nos chamados Direitos Humanos.


Não será que, genericamente, os chineses têm razão?

sexta-feira, maio 24, 2013

LIBERDADE E CRISE DE VALORES NO ESTADO DE DIREITO OCIDENTAL (nova edição do original de 2008)



A manifestação das liberdades individuais subjectivas desenha uma realidade objectiva composta pelo conjunto daquelas.


Cada liberdade individual subjectiva só deve poder ser limitada ou coarctada com referência a um conjunto de valores aceites pela generalidade dos cidadãos, valores esses referenciados por uma religião ou por normas jurídicas, para que possa haver segurança na previsibilidade dos comportamentos devidos.


Quanto maior a previsibilidade dos comportamentos devidos, maior a sanidade do conjunto das manifestações das liberdades individuais subjectivas, porque mais vinculado qualquer exercício de poder pelo estado.


Quando a referência àquele conjunto de valores se faz para uma religião, teremos um estado teocrático, em que os valores religiosos e as normas a impor coactivamente coincidem. Aqui, contudo, a previsibilidade dos comportamentos devidos é menor, pelo que é inevitável falar de menor liberdade individual subjectiva, com perda para o conjunto.


É o que se passa na generalidade dos países orientais.


No ocidente, pelo contrário, tal conjunto de valores é feito por referência a normas jurídicas emanadas do poder legislativo e laico, em que é perfeita a distinção entre normas religiosas e normas jurídicas, sendo que as primeiras apenas coagem interiormente, moralmente, mas não podem ser impostas coactivamente por qualquer poder do estado, o que acontece apenas com as segundas.


Em qualquer dos casos, tais normas, religiosas ou jurídicas devem ser precisas e previsíveis, sob pena de a generalidade dos cidadãos não conhecer os limites da sua liberdade individual subjectiva, nem que valores levam ou não às sanções do estado, gerando, pois, instabilidade do conjunto, ou um conjunto de poder opressivo, porque discricionário.


O oriente, normalmente, defende o estado teocrático porque só este pode fazer coincidir a moral e a ética aos comportamentos devidos, com as consequências que se conhecem.


Para o ocidente, pelo contrário, a moral e a ética distinguem-se das normas jurídicas porque só estas podem ser impostas coactivamente pelo poder secular – melhor dizendo: a boa moral e a boa ética devem ser interiorizadas pelas normas jurídicas nos valores por estas previstos, sem existências paralelas. Contudo, hodiernamente, constata-se a existência de argumentação “política”, no ocidente, de que a moral e a ética não se esgotam nas normas jurídicas. É uma tentativa de politizar as normas jurídicas, de buscar argumentos de lógica “religiosa”, “teocrática”, para enformar o estado laico. É fazer entrar pela janela aquilo que se expulsou pela porta. Daqui decorre, como consequência necessária e directa, que o estado de direito, por razões “políticas”, ou melhor, de argumentação “política”, entra em crise, pois os valores consagrados juridicamente são incompletos e não permitem a segurança na previsibilidade dos comportamentos que podem ser tidos ou não pela afirmação da liberdade individual subjectiva com base nas normas jurídicas.

Daqui decorre a crise dos valores no estado de direito ocidental.

sábado, maio 11, 2013

Vivemos numa ditadura em portugal...


Definindo ditadura, numa base jurídica, como aquele regime em que a lei é aplicada diferentemente a uns e a outros, conforme os caprichos do poder (judiciário ou disciplinar, “feito” com outros poderes), é evidente que vivemos numa ditadura em portugal.

(Victor Rosa de Freitas)

sexta-feira, maio 10, 2013

A Religião (melhor dizendo, a religiosidade) e a Política


A religião – melhor dizendo, a religiosidade – visa “religar” cada ser humano com a Existência, com o Absoluto, com Deus…
A religiosidade é a conduta individual de cada um com o seu próprio interior, para ser livre, isto é, encontrar a “essência” da Existência, do Absoluto, de Deus.
À medida que cada um se aproxima de tal “essência”, vai sendo mais solidário – interiormente, e, portanto, em verdade – com o seu semelhante e procurará que cada um seja individualmente livre, que se aproxime da mesma “essência”.
A política visa o poder terreno, que cada um adquira poder sobre os outros indivíduos, de modo a fazer prevalecer a sua vontade sobre os outros.
Na política, a solidariedade de cada um não é interior – como na religiosidade – mas apenas exterior, isto é, apela a outros para que se solidarizem com a sua causa, mas visando apenas ter mais peões de guerra do seu lado, para ter mais força face ao adversário, isto é, sobre aqueles sobre quem quer exercer o poder.
A religião, quando perde o sentido da “religação” individual, para se massificar, para defender toda a Humanidade, está-se a politizar, a entrar na esfera da política, isto é, quer-se transformar num poder sobre os outros.
A Humanidade, ao contrário do que possa parecer à primeira vista, não é uma qualquer “entidade” com existência real, mas tão só a soma de Todos os Seres Humanos.
Do mesmo modo, uma Comunidade é a soma de uma parte de todos os indivíduos humanos.
Quando um qualquer líder, religioso ou político, falar de “salvação” da Humanidade, ou mesmo de uma Comunidade, será certamente um “charlatão” político, pois a “salvação” apenas pode ser individual, isto é, cada ser humano deve encontrar o seu interior para encontrar aquela “essência” da Existência, do Absoluto, de Deus e, assim, ser absolutamente livre e eterno.
O mesmo se diga de um país: quando os políticos argumentam que para “salvar” um país é preciso sacrificar indivíduos, a sua linguagem é apenas a do poder e nada tem de religiosidade, pois só indivíduos podem ser “salvos” e não faz sentido salvar um conjunto sacrificando as partes individuais.
E a verdade é que se Todos os indivíduos se “salvarem”, salva-se também, inexoravelmente Toda a Humanidade.
Num determinado momento histórico terreno, para quem tem religiosidade, é necessário garantir as condições mínimas de liberdade e dignidade de cada um para que possa procurar no seu interior a comunhão com a “essência” da Existência, do Absoluto, de Deus e poder ser livre e eterno.
Mas “isso” é o que os políticos – religiosos ou não – não querem!
Pois para “estes” a “salvação” consiste em cada um mover-se com o seu pequeno (que “eles” julgam grande) ego para dominar todos os que puder, fazendo e desfazendo alianças com outros indivíduos, sempre com o escopo de atingir tal poder.
Assim se distingue a religião – melhor dizendo, a religiosidade – da política.

quinta-feira, maio 02, 2013

O PODER E O POETA (nova edição do original de 2007)

(Numa sala, algures…)

PODER: Levanta-te, Poeta!

POETA: (levanta-se)

PODER: Quem és tu, Poeta, para pensares que tens poder para aplicar a “lei” e o “direito” a toda a sociedade sem nossa autorização?

POETA: Sou magistrado. Ingressei na magistratura por concurso público, segundo a lei e fui considerado apto. Segundo a lei, os magistrados aplicam a lei para resolver todos os litígios, conflitos e crimes na sociedade.

CORO: O Poeta que é magistrado,
Julga que pode aplicar a “lei”
Sem autorização do Poder.
Ó Poeta, Poeta, o Poder é que determina a “lei”,
Se, quando e como a mesma é de aplicar.


PODER: Quem te ensinou, ó Poeta, que a “lei” é para resolver todos os conflitos em sociedade?


POETA: Mas não é o que diz a Constituição e toda a organização política do País?


PODER: Quem fez a Constituição fui EU. Quem faz as “leis” sou EU. Tu só as aplicas se EU e nos termos em que EU te autorizar! O MEU braço é longo e tenho controladores de Poetas e outros como tu em todo o lado. Nada podes fazer sem minha autorização.

CORO: O Poeta que é magistrado,
Julga que pode aplicar a “lei”
Sem autorização do Poder.
Ó Poeta, Poeta, o Poder é que determina a “lei”,
Se, quando e como a mesma é de aplicar.


POETA: Mas não vivemos num Estado de Direito, em que a lei regula as relações humanas e define o modo de compor os litígios?

PODER: O “estado de direito” é uma invenção minha. A “linguagem” do “direito” é igual à linguagem de qualquer “ideologia”. Serve apenas para pôr servidores dessa linguagem ao MEU serviço: todos os funcionários do “estado”, em que eu mando. Mas, para a ilusão ser perfeita, também criámos os fiscalizadores e aplicadores da “lei”: os magistrados.

CORO: O Poeta que é magistrado,
Julga que pode aplicar a “lei”
Sem autorização do Poder.
Ó Poeta, Poeta, o Poder é que determina a “lei
Se, quando e como a mesma é de aplicar.


POETA: Mas os magistrados não aplicam a lei a todos os casos e o Poder não pode controlar as suas decisões, conforme dispõe a Constituição e a Lei?

PODER: Os “magistrados” só decidem sobre aquilo que EU permito que chegue ao seu conhecimento. O que EU não quero que eles conheçam não lhes chega, percebes? E, depois, os mais “sábios” do “direito” estão sob a minha vigilância e controle e ao MEU serviço. Estes “sábios” dão a volta ao “direito” e o que é torto passa a estar direito e o que é direito passa a estar torto. Tudo em “linguagem jurídica”. Os “magistrados” nunca ME conseguirão controlar.

CORO: O Poeta que é magistrado,
Julga que pode aplicar a “lei”
Sem autorização do Poder.
Ó Poeta, Poeta, o Poder é que determina a “lei
Se, quando e como a mesma é de aplicar.


POETA: Mas…

PODER: Não há "mas", nem meio “mas”. Levem o Poeta!

(Três energúmenos cumpridores da “lei”, obedecem prontamente à ordem do Poder e arrastam o Poeta para fora da sala).
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